O CONGRESSO AMARELOU
No senado, Rui Barbosa
discursa.
-- A lei da vacina obrigatória é uma lei
morta. Assim como o direito veda ao poder humano invadir-nos a consciência,
assim lhe veda transpor-nos a epiderme. Logo não tem nome, na categoria dos
crimes do poder, a temeridade, a violência, a tirania, a que ele se aventura,
expondo-se, voluntariamente, obstinadamente, a me envenenar, com a introdução,
no meu sangue, de um vírus, em cuja influência há os mais fundados receios de
que seja um condutor da moléstia ou da morte.
Sodré também ocupa a tribuna.
-- Vejo nessa Lei o abastamento do regime
republicano convertido nesse produto tematológico que aí está. Regime em que
imperam os tiranos, regime de igualdades em que predominam os mais odiosos
preconceitos e que convertem os estado da união em propriedades de famílias
dinásticas. Antigos republicanos de boa origem e alta estirpe já se sentem
desamparados e desejosos de sair dessa situação à bala se for preciso.
Parlamentares protestam contra o discurso; o
senador Sodré os argui:
-- Por
que ter assombro das revoluções quando elas são salvadoras?
Há aplausos e novos protestos. Outro que discursa, mas na Câmara Federal, é
Barbosa Lima.
-- Lei ignominiosa que exige a carta do corso
para a mais infame pirataria, contra a qual todas as insurreições serão
eternamente gloriosas.
Informado por seus agentes dos discursos,
Silva Castro parte para relatar as ameaças dos senadores para o superior, o
ministro da Justiça. Na antessala ministerial, depara-se com Seabra e Theodoro,
reunidos com a imprensa. O ministro contemporiza insatisfações jornalísticas
com relação à publicação dos dispositivos da lei.
-- São apenas ideias gerais do
nosso Diretor de Saúde.
-- Por que somente um jornal pode divulgar
essas ideias?
-- Melhor se informar com A Notícia.
-- O ministério não tem controle de suas
informações, excelência?
-- Sabe bem a resposta, meu caro. E
acrescento que distribuímos ontem cópias para higienistas de renomado saber,
com o objetivo de que avaliem os regulamentos e façam as suas sugestões.
Estamos ainda em fase de discussão.
-- Quem são esses higienistas?
-- Podem ter a lista com o meu auxiliar.
-- O senhor é contra ou favor desses
dispositivos?
-- Se dependesse de mim, o regulamento se
resumiria na cláusula de que cada pessoa pode ser vacinada pelo médico de sua
confiança.
Theodoro acha a resposta infeliz e encerra a coletiva.
-- Muito obrigado, cavalheiros.
-- Só uma pergunta a mais...
-- Excelência, responda apenas...
-- Por favor, senhor ministro, faltou
dizer...
Nenhum pedido de informação os detém. Entram
no gabinete e são seguidos por Silva Castro, que os põe a par dos discursos no Senado e na Câmara.
-- O Congresso amarelou. Quem era a favor
agora é contra a vacina e os subversivos já incitam o conflito armado.
Theodoro percebe as condições inseguras do
desfile de 15 de novembro.
-- É caso de suspender a parada militar.
-- O Exército chiará.
-- Antes chiadeira que coisa pior.
-- Vamos ouvir quem de direito.
Rodrigues Alves aprova o cancelamento da
cerimônia e Theodoro opina sobre quando divulgar a suspensão.
-- Quanto mais próximo do evento melhor.
Serão pegos de surpresa, enquanto nós já estaremos preparados para um
enfrentamento,
-- Divulgaremos, então, somente na véspera. Essa é uma decisão confidencial, até segunda ordem, diz o presidente.
-- Sim senhor.
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