DE ARTICULAÇÕES
Autoridades
e convidados se reúnem na Avenida Central. Folhagens e bandeiras hasteadas decoram
o espaço, onde um equipamento moderno está no centro. Sobre os montes de escombros do entorno, operários e curiosos espiam o
evento, que conta com a cobertura da imprensa.
Rodrigues
Alves discursa, descerra a placa fixada numa pedra de granito, que registra
neste oito de março de 1904 o início da reforma da Avenida Central. Em seguida,
liga o motor de um possante perfurador. Barulho e muita poeira fluem em meio
dos aplausos. Depois é a vez de Muller trabalhar com a britadeira. Tudo se
repete: poeira, barulho e palmas para a modernidade a caminho da cidade.
Theodoro
acompanha o evento, atento aos populares. Receia tumultos e não vê a hora do
presidente retornar para o Palácio, onde um almoço coroará as comemorações. Tão
logo o chefe da nação parte, consegue ir sozinho com Rio Branco no coche do
ministro que acaba de chegar de uma viagem diplomática. Na primeira
oportunidade, parabeniza-o pela iniciativa de firmar uma aliança militar com o
Equador, no caso de haver um conflito armado entre o Brasil e o Peru. O
ministro se surpreende.
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Pensei que esse assunto ainda fosse confidencial.
Theodoro
percebe que errou ao escolher o tema como introdução do que quer abordar. Em
tom de cumplicidade humorada, contorna a situação.
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Ainda é, barão. Mas não posso abster-me de cumprimentá-lo. Parabéns. Não
poderia ter identificado um aliado melhor para nossas questões de fronteiras.
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Cortês, como o pai! Mas poupe lisonjas. Apenas iniciamos as tratativas.
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Com boas perspectivas de êxito. Afinal o Equador tem uma rixa territorial antiga com o Peru.
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Como sempre, atento a tudo.
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E preocupado. Penso se os melhores militares estão de fato a proteger o Acre.
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Com base em quê diz isso?
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Nos oficiais intermediários convocados. O capitão Herculano Dias, professor de
Táticas da Escola da Praia Vermelha ficou de fora. Distinguiu-se em Canudos e
tem aptidões para o diálogo.
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Boa combinação de atributos para integrar uma ocupação militar.
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Por isso minha lembrança e ao senhor. Temi que Argolo considerasse uma
ingerência nos assuntos do seu ministério.
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Fez bem. Falarei com o ministro acerca desse oficial.
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Como o senhor mesmo diz, nós não podemos ser ingênuos com relação à nossa
integridade territorial. A guerra entre o Japão e a Rússia é um alerta.
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Exato. Temos de ter sempre em perspectiva a cobiça e o mapa do mundo. Com
grande parte da Ásia e a África partilhada entre as potências mundiais, sobra a
América Central e a do Sul. Matéria-prima de menos e população demais atiçam o
desejo por terras e outras riquezas alheias.
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Sobreviver quem puder e dominar quem puder. É a lei.
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O mundo dos mais capazes.
Num
coche mais atrás, Argolo, recém-chegado do Acre, ouve Costallat reportar sobre
o discurso de Herculano e a visita de Theodoro. Revela insatisfação em saber da
ingerência do secretário de governo na pasta da Escola, concorda com a ausência
de punição para não pôr em risco os ânimos na Escola, porém recomenda que o
Capitão Dias seja advertido quanto à inadequação do seu arroubo patriótico.
Costallat
cumpre a determinação. Orienta Herculano a não deixar mais a emoção comprometer
o seu comportamento militar. O Capitão, por sua vez, aproveita o ensejo para
sondar o potencial conspiratório do superior.
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O fato não se repetirá. Discursei em momento de comoção com os despejados. Não
depusemos a monarquia para ampliar o privilégio de uma minoria bem nascida nem
para agravar as condições de vida da maioria humilde.
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Somos preparados para lidar com situações difíceis, Capitão. Melhor que não
manche seu histórico de oficial com outra comoção.
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Perfeitamente, senhor.
Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S.
Campos
Copyright
de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos
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