CRUZADA CONTRA A HIDRA DO MERETRÍCIO
A modernização do porto, a
construção de bulevares e a difusão da iluminação elétrica são iniciativas
apropriadas para fazer o Distrito Federal prosperar como um centro cosmopolita.
Mas, sem o fim do meretrício, continuaremos vulneráveis à degradação física e
moral causada pelas dissolutas que povoam nossa cidade.
Na alcova das mundanas,
maridos contagiam-se com doenças e para o leito conjugal levam a moléstia à
esposa, que transmite aos filhos a danação. Nas ruas e avenidas, jovens
imaturos são atacados pelas servas do vício e donzelas e senhoras são
insultadas com a exposição indecorosa das degeneradas. Em outras ocasiões,
famílias de bem convivem sem saber com as insidiosas que ocupam as poltronas
dos teatros fantasiadas de mulheres honestas. A impudicícia desonra a
civilização e mina os esforços rumo ao alcance de uma socialização adiantada.
A moral deve ser a base de
uma sociedade constituída e cabe ao Estado ditar a lei para o aprimoramento das
virtudes dos indivíduos. De tal modo, demolir os antros do pecado também é
responsabilidade do nosso governo que deve prender as prostitutas e deportar as
estrangeiras. Punições também devem alcançar os praticantes desse mal sejam
eles autoridades ou não. O exemplo é meio de instrução e barreiras contra a
imoralidade devem ser erguidas, se quisermos defender nosso lar e nossa
sociedade da degradação.
Convocamos os chefes de
família a se alistar nesta campanha de proteção dos bons costumes. Escrevam
senhores. Manifestem seu repúdio e exijam medidas contra a hidra do meretrício.
A família brasileira agradecerá a honradez do seu gesto.
OS CRUZADOS DA MORAL
Catarina
termina a leitura da sua carta publicada em jornais da cidade. Com satisfação,
paga Adamastor, que trouxe os exemplares.
--
Muito bem, aqui está a parte final do nosso trato.
--
Obrigado. Permita-me uma palavrinha antes de partir?
-- À
vontade.
--
Agradecido. Pois então, como falei, foi difícil fazer o serviço. O caminho é
comprido do balcão até a tipografia.
-- Não
se preocupe. Trata-se de um assunto de utilidade pública.
-- Só
que não passou pela aprovação. É muita gente para achar que a ordem veio de
cima e que o texto podia ir para a máquina.
--
Como é bem relacionado! Espero que o carteiro que me indicou também o seja.
-- É
sim, madame. Porém, tudo tem um custo, às vezes, diferente do pensado. Ainda
mais quando não pode haver erros de espécie alguma.
--
Disse certo. Erros são imperdoáveis.
--
Pode então melhorar o agrado em nome do esforço?
-- Só
estou fazendo um favor para uma pessoa muito importante.
--
Quem sabe se falar com essa fidalguia...
--
Acho melhor não. Quanto menos gente souber do senhor, mais protegido estará.
Mas, aguarde um momento, por favor.
Catarina
se dirige à escrivaninha decidida a não pechinchar a sua segurança. Abre a
gaveta e ali manuseia algumas notas que entrega dentro de um envelope.
-- Por
favor, aceite esse mimo.
--
Madame é muito gentil.
--
Faço gosto. O senhor demonstra saber que o combinado nunca sai caro.
-- É
bom lidar com quem entende das coisas.
-- E
com quem sabe cuidar bem da vitória e preservar a boa sorte, não é mesmo?
-- E
como! Quanto ao carteiro, pode ficar tranquila. Ele sabe disso também.
-- Que
bom! Fico no aguardo dele. Passar bem, senhor Adamastor, diz desejosa de ficar
sozinha e se concentrar nos próximos passos da campanha.
Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
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