AO RESSOAR OCEÂNICO
Ao
longo dos próximos dias, Páscoa desperta um pouco mais para a vida. Às vezes um
movimento simples e banal, como o de girar a cabeça ou virar de lado, remete
seus pensamentos para o fluxo e refluxo das águas sobre seu corpo, enlaçado ao
do banhista. Repete o movimento com vagar, para ampliar a memória do ir e vir
sob a força das ondas. Outras vezes, quase adormecida, ouve o rumor do mar como
a voz do seu destino. Ainda que em sonho, quer viver suas emoções mais
secretas. Mergulha nas vagas brancas do lençol e dos travesseiros, entregue ao
ressoar oceânico.
Nova
manhã. Tobias empacota mantimentos sobre o balcão de olho no banhista, que se
esgueira rente à parede em direção à porta, de onde avista a frente do sobrado.
Uma janela no segundo andar está fechada em meio a todas as outras abertas.
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O povo tá falando que o médico dispensou seus serviços.
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Acontece.
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Dizem que nem na clínica do Dr. Magalhães arruma serviço mais.
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Não vivo do mar.
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Mas o cerco tá montado. Tião do Congo sondou sobre você. Falei o que acho:
gente de bem, vem e vai sem criar confusão.
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Obrigado.
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Não tem que agradecer. Fez o que fez e na razão. Não se vira uma mulher de
cabeça pra baixo, muito menos no mar. Foi o que eu disse.
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Daqui a pouco tudo se aquieta.
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Enquanto não, saia da vista. Não arraste o que deve ficar pra trás.
O
aconselhado não responde. Talvez siga o conselho, se a luz da razão romper o
nevoeiro da emoção. Volta a olhar para a
janela fechada. Suspeita que lá esteja o saudoso corpo que acolheu em seus
braços.
Copyright © 2013
by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by
Maria Tereza O. S. Campos
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