AS BADALADAS
DO CARRILHÃO CELESTIAL
Mariinha está diante de Abreu Vaz, num
quarto da Casa Rosada. Sua camisola é branca e o cabelo está solto. O
magistrado, por sua vez, sentado numa poltrona, apoia as mãos apoiadas numa
bengala. Elegante, ostenta num mindinho um anel de rubi e se esforça para
seguir os conselhos de Ninon de silenciar suas preocupações. Mariinha também
recebeu incisivas recomendações, sobretudo com relação a não pôr a carroça na
frente dos bois para conquistar a proteção aspirada. Repetida até no último
instante, a recomendação gerou insegurança, e, embora simpatizada com a figura
do magistrado, que acha ter cara de protetor, titubeia sem saber como iniciar o
que lhe cabe fazer. Embaraçado numa hesitação parecida, o juiz procura se
tranquilizar, acalmando-a.
He carries the
fashionable Homburg hat
, 1907, painting by Anders Zorn
, 1907
-- Não tema, senhorita, serei muito
respeitador e gentil.
Como um vento, a declaração dissolve o
encabulamento de Mariinha, que, com mãos lépidas e ar faceiro, pressiona as
faces do magistrado.
-- O senhor é tudo o que eu sempre sonhei!
Em olhos febris, boca em bico pela pressão
das bochechas comprimidas, o rendido rosto expressa o pavor do fracasso sexual
misturado ao desejo suplicante de atendimento. Durante esses instantes, Abreu
Vaz vê as mãos libertarem seu rosto, lançarem a bengala ao lado e
entrelaçarem-se ao redor do seu pescoço. Sente a jovial carne roçar por entre
suas pernas. Seu baixo ventre se contrai e o formigamento se dissipa pelas
entranhas afora. Relampeia a percepção de que um milagre pode ocorrer e ele não
se contém: enlaça a milagrosa pela cintura com o fervor de um penitente ungido
pela misericórdia divina. Mariinha o acolhe num carinhoso abraço.
-- Como sou feliz do senhor me querer.
Os seios tenros a almofadar a face... O sexo
ansiado a pressionar o ventre... O calor! A fragrância! A maciez da carne...
Tudo embebeda Abreu Vaz e lhe dá certezas de que encontrou o elixir da sua
masculinidade. Num súbito sôfrego, ergue a barra da camisola e Mariinha reage
em estimulante aprovação.
-- Ahhh, ioiô! Ai!
O magistrado arrepia-se de prazer ao tocar a
pele nua.
-- Oh meu pitéu, meu piteuzinho!
A jovem apoia uma perna dobrada sobre a dele
e o desbravamento avança: da cabeça aos pés, o juiz estremece ao espalmar as nádegas
que meneiam ao sabor do afago. Outros estremecimentos ocorrem quando alisa a densa
pelugem. A moça adora ao sentir os dedos abrirem as pétalas da sua preciosidade
e deslizarem para dentro.
O magistrado geme. Mariinha também. E a ressureição
da carne evolui. Frenético, Abreu Vaz abocanha um seio coberto, depois o outro,
em seguida os tira para fora do decote e divide a avidez de tê-los em sua boca.
-- Ah! Oh! Ui, Ioiô, o senhor é demais!
Batimentos cardíacos acelerados, olhar vidrado,
Abreu Vaz se declara.
-- Nunca, nunca, conheci alguém como a
senhorita.
-- E eu que há tanto espero pelo senhor!
Mariinha afaga o rosto arrebatado enquanto
contorna a poltrona. Atrás do encosto, deixa cair a parte de cima da camisola e,
com a ponta do nariz, roça a nesga de pescoço deixada à mostra pelo hirto
colarinho.
-- Hun, que cheiro bom!
Prossegue as carícias. Resvala os seios no
pescoço do magistrado, lambe suas orelhas, enquanto a cabeça de Abreu Vaz
pendula de um lado para outro, meio tombada para frente, e o pênis treme em
arrebites, como um zanga-burrinho esguelhado e sem força para baixar por
completo a vertente oposta. De estímulo em estímulo, tátil e verbal – vamos
ficar folgadinhos –, Marinha retira o casaco, o colete, a gravata e o colarinho
de Abreu Vaz, a essa altura um todo de brancura corada que diz sim, sim, sim, a
cada pedido para ser despido. Como um balão, seu rosto parece aumentar quando a
jovem se põe na frente dele, desfivela o cinto da calça e o tira num puxão. A
visão dos seios nus exige a nudez completa – e Abreu Vaz a despe,
atabalhoadamente. Devora de alto abaixo o corpo curvilíneo e fixa no tosão da
vulva.
-- Gosta meu ioiô?
-- Oh, e como!
Em dedos febris, Abreu Vaz desabotoa a
braguilha... Mariinha se vira para trás e põe o cinto sobre uma mesa baixa.
Os volumosos montes rebitados, o alucinante
regaço, cada milímetro da sustância contemplada endoidece e tortura Abreu Vaz.
-- Você é minha, minha e de mais ninguém,
diz ainda estatelado na cadeira.
Mariinha vira o rosto e avista a rósea cabeça
do pênis à mão febril.
-- Que peixão, ioiô! Num quer brincar com
ele aqui?
Lança o convite e rebola os quadris... De
pronto o magistrado se ergue, esbaforido – a calça cai. Agarra uma anca e com a
outra mão força o peixão a penetrar por entre os montes. Sem êxito, lança-se de
joelhos no chão e afunda o rosto nas nádegas e as beija e as separa e as lambe
e suga o que quis penetrar.
-- Oh, Ioiô! É bom... É bom... É bom demais,
exclama Mariinha.
Arrebita mais a nádega, agora com os braços
cruzados sobre a mesa.
-- Toma pra ti, ioiô, que é tudo do senhor.
O magistrado se lambuza de mais prazer.
Ocorrem outros sucessivos ohs! ahs! uis!
-- Morrerei sem você, diz com a respiração
entrecortada.
-- Morre, não! Sou toda tua. Bom... – diz e se
vira. Com ar dengoso, continua a falar: -- Guardei minha preciosidade só pro
senhor.
-- Ó, meu anjo, responde o magistrado
ajoelhado, pênis semirrígido para fora da ceroula branca comprida e a calça
arregaçada até os tornozelos.
-- Cuidará bem de mim depois?
-- Cuidarei, meu piteuzinho.
-- Palavra de doutor?
-- Sim, meu elixir.
Mariinha suspira! Sem tirar os olhos dele e
com uma expressão iluminada por convidativas safadices, deita-se de costas e
escorrega o ventre um tanto para fora da mesa, com as pernas separadas.
O deslumbre luz no rosto de Abreu Vaz, que
admira os lábios vaginais, como se andasse num ir-e-vir por entre eles.
-- És um vulcão, menina.
-- Vem! Aguardo o senhor desde que nasci.
Tomado pelo frenesi, o magistrado esfrega a
cabeça do pênis ao longo do úmido e escorregadio solo. O peixão ganha potência
e penetra o sorvedouro, em êxtase. “Consegui” pensa. Logo mais, goza. Chega
ouvir as badaladas do carrilhão celestial.
Na manhã seguinte, Mariinha a ostentar o
anel de rubi do juiz. Renascido em vida, Abreu Vaz regressa no fim do dia, para
rever sua fantástica menina. Felicíssima de vê-lo de volta, Mariinha se esmera nas
brincadeiras com o peixão dessa vez na cama. De novo, o carrilhão badala em
júbilo.
-- Menina, você é demais.
-- O senhor que é e para tristeza minha.
-- Ora por que diz isso?
-- Porque quero ser só do senhor.
-- E é. Já falei com Ninon. Você é minha e
de mais ninguém.
-- Mas aqui?
-- Sim terá um quarto só pra ti e pro seu
ioiô.
-- Não é a mesma coisa.
-- Que coisa?
-- Não sou mulher da vida – só uma moça que
por precisão veio para cá e, de tanto rezar pela salvação, teve a graça de
encontrar o senhor.
-- Aonde quer chegar com essa estória?
-- Quero que me tire desta vida e monte casa
comigo.
-- Que caraminhola é essa?
-- Não vai gastar para eu ser só tua? Gaste
bem com uma casinha só pra nós.
-- Não posso!
-- Por que não?
-- Mal nos conhecemos.
-- E já somos tão felizes.
-- Mas leva-se tempo para tomar uma decisão
como essa.
-- O peixão aí não precisou desse tempo todo
para saber o que quer.
-- Mas uma coisa é uma coisa, outra coisa é
outra coisa.
-- Se é assim, nunca mais me verá.
Num pulo, Mariinha se levanta da cama e
veste a camisola.
-- Não me ameace, nem se atreva a fazer
isso.
-- Se não voltar em cinco dias com uma decisão,
fugirei e vou buscar um homem corajoso para ser o meu protetor.
-- Não posso ter uma teúda e manteúda. Sou
casado, um magistrado, um juiz.
-- Problema do senhor, porque eu serei de um
que pode.
Nu, perplexo, sentado na cama, o magistrado
vê Mariinha sair.
-- Ó, meu Deus, o que faço? Não vivo mais
sem essa diabinha.
Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S.
Campos
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de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos