sexta-feira, 29 de maio de 2015

Capítulo Sessenta e Nove

O COMÉRCIO DO BRASIL


Theodoro passou o fim de semana nos braços de Ninon. Só pela manhã tomou conhecimento do lançamento do Comércio do Brasil e acaba de receber em seu gabinete, o chefe de polícia.
-- Ia ao seu encontro.
-- Antecipei-me e creio que pelo mesmo motivo.
-- Explosiva a publicação, diz mostrando o jornal.
-- Tanto que peço licença para, em casos como esse, incomodá-lo onde estiver quando se ausentar de vossa residência.
Theodoro desconfia de que Silva Castro esteja ciente de qual foi o seu paradeiro nos últimos dias. Ignora o fato e o pedido.
-- Quando soube do jornal?
-- Na madrugada de domingo, mas isso aqui, na manhã de sábado, fala e lhe estende uma folha.
Theodoro lê uma carta de Leopoldino a Varela. Fica ciente da satisfação do remetente em informar que a causa da regeneração da República se propaga pelo país afora com novas adesões. Passa os olhos pela lista dos novos correligionários que se comprometeram em vender assinaturas do jornal e pergunta o que depreendeu de ter acessado o conteúdo:
-- Imagino que redobrou sua atenção no Correio e Telégrafos.
-- Exatamente como combinamos.
-- O que pensa fazer agora?
-- A carta original será entregue hoje ao deputado e a cópia para o ministro.
-- Acautele-se. Seabra informará o presidente e ambos ficarão precavidos com seus métodos de trabalho.
-- Com os nossos!
-- Claro que sim, mas é você que quer pô-los a par.
-- Entenderão a nossa intenção em não sobrecarregá-los fora de hora.
-- Aconselho-o a transformar o conteúdo em conjecturas. São compatíveis com a sua mente arguta e se se beneficiará com esse procedimento. 
-- Porém a carta é a prova.  
-- Brás Lopes está na lista e escreveu no jornal. Tem o que precisa.
-- Mas não pego Leopoldino.
-- Pense bem na adequação de denunciar gente do relacionamento de um superior. Irá deixá-lo sem espaço para manobrar a situação conforme a conveniência dele. O desconforto pode se voltar contra você.
-- Não está preocupado com a segurança nacional?
-- Preocupadíssimo. Mas graças a sua eficiência já sabemos quem sustenta os insurretos. E a situação se configura como uma briga de família. Tem de ser resolvida de outro jeito. O presidente ouvirá pela voz do ministro suas suspeitas e saberá como agir. Enquanto você terá cumprido seu papel da melhor forma e sem se expor.
Theodoro vence a peleja. Acompanha o chefe de polícia até a porta e se dirige ao gabinete presidencial para encarar de vez as consequências de não ter evitado aquela publicação. Na antessala, cruza com o ministro da guerra, que acabara de sair de uma reunião com Rodrigues Alves. Logo mais, está sentado diante do presidente. As edições do Comércio do Brasil se exibem sobre a mesa.
-- Sinto pela publicação: escapou por completo ao meu controle.
-- Conter a oposição é colher água com a mão. Cuide para que esse jornal não puxe para baixo vossa eficiência.
-- Cuidarei. E garanto ao senhor: o projeto da vacina será reapresentado em breve e agirei para acalmar os ânimos da redação do Comércio do Brasil.
-- Ótimo. Se procurado pela imprensa, não dê importância ao apelo de intervenção armada. Bata na tecla de que o contraste de opiniões faz parte da democracia.
-- Há a perspectiva de aplicarmos a lei caso continuem a instigar a sedição?
-- Apenas em última instância que não ocorrerá. Vamos trabalhar para chamar a razão dos nossos conhecidos.
-- Perfeitamente.
-- Irei ver quem pode ombrear com o senhor esses esforços e volto a lhe falar para evitarmos as cabeçadas de tarefas duplas.
-- Sim, senhor.
-- Faz-se necessário.


Após a reunião com o presidente, Theodoro instrui BV.
-- Descubra quem é o proprietário do imóvel, se usam tipografia própria ou alheia, quem fornece tinta, papel, como distribuem o jornal e para que cidades. Levante também com que banco trabalham e me descubra quem é Apolônio Cidadão. Quero um relatório completo. Bote o Coelho para te ajudar .
-- Sim, senhor. Os gastos correm como de costume?
-- Exato. Onde está Vivaldino?
-- Na viração.
-- Quero-o dentro da redação. A prioridade lá é esse tal de Apolônio Cidadão.
-- Pode deixar. Quanto a Vivaldino, ele tem jeito para contínuo e expediente para pedir a vaga, mas sem um empurrão não consegue entrar.
-- Vou arrumar uma carta de recomendação, diz e libera BV, cismado com o desconhecido jornalista. Quem é esse sujeito?

Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos

Nenhum comentário:

Postar um comentário