segunda-feira, 11 de maio de 2015

capítulo Cinquenta e Sete

HERMOSA PERO TONTITA.

Diante de Ninon de Valoir e em meio do luxo do ambiente, Mariinha é uma estátua viva, palpitante de coragem e receios com relação ao passo que está prestes a dar. Nem se mexe quando Abel Adonis sai do aposento. Soledad, a responsável pela governança feminina da Casa Rosada, fecha a porta e se posta atrás da poltrona ocupada por Ninon, que se mostra amável com a moça.
-- Sente-se Mariinha.
-- Se não se importa, senhora, pode me chamar de Margot?
-- Claro que posso.
-- Muito agradecida. Vou sentar, viu? Dá licença.
Soledad faz uma cara de entojo.
-- Decidida a ser uma das minhas pupilas?
-- Ah, sim, madame. Quero muito viver bem e ter um protetor.
-- Madre mia! Que desatino!
-- Soledad!
-- Pero no es ni una cortesana e já está pensando em tener um protetor?!
-- A senhora fala tão gozado, Dona Soledadi.
-- Psiu! Aqui só se hablas cuando a senõra pergunta.
-- O que conhece da arte do amor?
Encabulada, Mariinha sorri.
-- Ah! Umas coisas mais do que outras e até a beiradinha do finalmente. Sou moça donzela ainda e quero ser deflorada pelo meu protetor.
-- No lo sé, no lo sé, isso no vá a funcionar, exclama Soledad descrente de que Mariinha dê certo no bordel, se o que mais quer é ter alguém que a proteja.
-- Se quer trocar sua virgindade por uma proteção segura, melhor se casar.
-- Como, dona Ninon? Se só aparece pretendente pobre ou rufião que quer ter a minha preciosidade sem me dar o melhor. Por isso cá estou. Quero achar meu protetor.
-- Nina tonta, diz Soledad fazendo com a mão um gesto de desdém.
-- Ora, por que, dona Soledadi,
-- Argh! Sueños no son habas contadas.
-- Como é que é?
-- Sonhos não são favas contadas.
-- Não posso ter aqui o mundo aos meus pés e até conhecer o amor?
-- Se esmerar e a sorte ajudar... Quantos anos tem?
-- Já fiz dezoito, mas digo que sou de menor. Num pareço?
-- Parece. Ande um pouco pela sala para eu ver você melhor.
-- Por quê? A senhora sofre das vistas?
-- Ih! Hermosa pero..., exclama Soledad virando o rosto de lado.
-- É só inexperiente.
-- Mas aprendo tudo rapidinho.
-- Então vá até ali e volte como se estivesse sendo olhada pelo seu protetor. Quero imaginar como ele apreciará você.
-- Ah! Entendi. Espera só um pouquinho.
Mariinha suspira e o ar faceiro começa a emanar do corpo ainda sentado e depois no molejo do movimento. Ninon analisa o andar – um tico de requebro de menos deixará no ponto. Durante a volta, pede que tire a roupa.
-- Mas, senhora?
Soledad se aproxima.
-- Não queres ser una cortesana? Hay que tirar la roupa.
Ruborizada, Mariinha se despe e cobre o sexo com as mãos. Ninon anda ao redor segurando a haste longa de um pincenê: magra em boas carnes. Seios firmes, fartos; ancas largas, traseiro saliente, pernas e pés bem feitos, só mal tratados. Mexe nos cabelos: podem ficar sedosos. Acaricia o rosto da moça, depois, desliza os dedos por um braço – óleos deixarão a pele macia. -- Sorria, com todo o encanto que puder. Sorriso maroto – produzirá bom efeito. Abra a boca – bela dentição. O que te pareces, Soledad?
-- Buena conformación.
-- Erga os cabelos com as duas mãos, Margot.
Constrangida, Mariinha obedece, e Ninon fita a pelugem da vulva – densa! Será bem apreciada, não?
-- Por que te importa com isso, si a brasilenos les gusta mucho o outro lado?
-- Pode se vestir, Margot.
Mariinha levanta as peças do chão com os olhos na cortesã.
-- A senhora me aceita?
-- Terá casa, comida, cuidados e instrução de como se portar e na arte do amor. Se estiver pronta, estreará na festa de Aleluia...
-- Com o meu...
-- Cállate e escucha!
-- Se aprovada, fica na Casa e falamos sobre o pagamento.
-- Sim, senhora.
-- Soledad, leve Margot para o exame do Dr. Amâncio e a entregue aos cuidados de Desirée. As aulas seguintes serão com Aimée. Veja também roupas. Providenciarei com Reverbel, um perfume para a nossa trigueira.
-- Es lo que voy a hacer. Ande, chica. Termine logo com isso, porque yo no tenho todo el tiempo del mundo.
-- Ah! Dona Soledade, se a senhora não falar direito, num vou te entender.
Enquanto a jovem se prepara para se lançar na prostituição, Ismênia e Altino padecem as dores do seu desparecimento, em carta de despedida lida e relida: fui embora; não se agastem, venho visitar quando tiver com a vida ganha. O pesar é fingido em Bertoleza, que mira a feição carrancuda de Rubião com seu olhar desconfiado.

Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos


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