sábado, 9 de maio de 2015

Cinquenta e Quatro

DO MAL DOS DESPEJOS


-- Isso pede quebra-quebra. Só a fuzarca acorda de vez o Soneca, diz Touro de modo veemente.
Depois, Damião da Silva, de trinta e alguns anos, fita os presentes, com a sua convicção de que só tumultuando a solenidade de inicio da reforma da Avenida Central, o presidente do país atinará para o mal dos despejos. É um homenzarrão negro, de branco dos olhos quase sempre avermelhados.
O local é o CCO, Centro das Classes Operárias, e a situação, a reunião dos associados despejados. Vicente de Souza, presidente-fundador da entidade, médico e socialista, na casa dos cinquenta anos, silencia sua rejeição à proposta.
-- Alguém tem outra sugestão?
Rostos se entreolham, ninguém fala e Touro, ainda de pé, pede para que seja posta em votação o quebra-quebra. Vicente resiste.
-- O confronto não nos ajuda. Melhor a lei e a paz, seu Damião.   
-- Defende uma ordem que bagunça a vida da gente?
-- Defendo a legalidade, a exemplo de um abaixo-assinado. Podemos encaminhá-lo para Municipalidade e também para o Congresso Federal.
-- Isso não vai levar a nada. Nosso caminho é do debate e do convencimento.
-- Não tem tido serventia. Político é um bando de cartolas, sem respeito e atenção aos reclamos e às penúrias dos operários.
-- Nem todos!
-- Mas não dão no coro. É coisa de luta, seu Vicente.
-- Não será com depredações e vandalismos que atrairemos para a causa socialista o apoio dos obreiros do nosso país.
-- Fique então com essa bosta de ordem porque eu tó fora.
A saída de Touro estimula a de outros. Apesar de não ter sido despejado, Correia compareceu ao encontro para se solidarizar com os demais companheiros. Preocupa-se com o esvaziamento e com a atitude de Vicente em procurar apoio junto aos políticos em hora que requer apoio imediato aos despejados. A reunião termina sem resultados. 

Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos

Nenhum comentário:

Postar um comentário