REAÇÕES ÀS LEIS APROVADAS
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O Brazile! A Tchidate do Rio!
-- Óia A Gazeta! O País! A Alvorada!
-- O Curreio da Manhã já saiu! O Jurnal du Cumércio
também.
-- Vem aí os código de higenis do Brasil.
-- Agora é a vera. Nun pode mais cuspi na rua nem
ter bicho no quintal.
Em sotaques e tons diversos, os meninos jornaleiros
entoam as manchetes do dia e atraem a atenção dos passantes. Vendas se
sucedem, enquanto jornais são lidos no meio da rua, aos balcões dos quiosques e
nos bancos dos bondes. Em pouco tempo, o rumor dos detalhes da aprovação das
novas Leis Sanitárias circula pela cidade afora. Formam-se o grupo dos
contrários e o dos favoráveis às Leis, em sintonia com a opinião dividida da
imprensa. Um editorial chama de draconiano o novo código de higiene e acusa o
Congresso de conivência com um governo descomprometido com as liberdades civis.
Outro saúda o rigor do combate às epidemias e prevê que os regulamentos irão
regenerar os costumes locais nos moldes dos hábitos das mais civilizadas
nações.
A
notícia também atrai a atenção de dois majores lentes da Escola da Praia Vermelha,
a espera do início das atividades do dia. Herculano entra na sala e cumprimenta
os superiores. Observa os jornais lidos e ocupa seu lugar à mesa, onde compõe a banca do exame oral de alunos em segunda chamada. Agostinho deixa a gazeta de
lado, com um esgar reprovador.
-- Esperem reação. Esse Código Sanitário abalará as
bases do Governo.
-- Faço votos que não, diz Aurélio, virando a
página do seu jornal.
-- Continua um conservador.
-- Como militar, cumpridor da nossa missão de
segurança nacional, como cidadão, adepto da concórdia e avesso à ideia de me
bater contra patrícios.
Em
outra circunstância, Herculano ignoraria essa desavença, que é antiga entre os
dois, mas não nos dias atuais. Com a escuta aguçada na conversa, finge conferir
a relação dos alunos inscritos no exame. Agostinho prolonga a picardia.
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A lealdade de companheiro compensa a timidez dos atributos de cidadão.
Aurélio
larga o jornal e inclina a cabeça para o lado.
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Recíproca verdadeira no que tange ao companheirismo de farda, e meu espanto com
um adepto de Comte aspirar a agitações.
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Major, o mestre condenava as revoluções quando injustas, mas, jamais, como
recurso extremo contra a tirania.
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O que não é o caso.
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Se presente ontem no Senado, teria outra opinião, não acha Capitão Dias?
Herculano
entende que começaram as consultas conspiratórias. Durante esse instante, em
que ainda ressoa a pergunta e antecede a resposta, a imagem da República surge
diante dele, como se corporificada num ser diáfano, e desaparece tão logo Aurélio
atropela a réplica.
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Até o senhor, Capitão?
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Perdão, não entendi a colocação.
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Está metido também no agito das galerias políticas?
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Não se apresse em julgar, major. O capitão se mantém na posição de observador
que tão bem conhecemos, intervém Agostinho a perscrutar a fisionomia de
Herculano.
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Bom saber. A lucidez faz um militar.
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Atributo que recorro para balizar minha leitura. Estou certo em pensar,
Capitão, que se esgotam os meios pacíficos para conter as arbitrariedades do Governo?
Herculano
sente-se posto a prova e incomodado em se denunciar a Aurélio.
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Agradeço a deferência, major. Porém, creio que as medidas falam por si. O
Código é coercitivo, a criação da Justiça Sanitária, inconstitucional e são espúrios
os valores pagos aos terrenos desapropriados.
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Um parecer demolidor, Capitão. Contudo lhe dou razão quanto ao lamentável valor
das indenizações. Tudo o mais não, pois tem a sua razão de ser.
-- Não violando os direitos individuais, enfatiza Agostinho.
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A situação não cabe livre-escolha.
-- Nem permite pôr cabresto nos cidadãos.
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Contenha-se, Major. A questão afeta o coletivo e somos disciplinados a acatar ordens.
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Somente as inteligentes.
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Isso me soa discurso de tempos passados.
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Onde tudo começou e ainda não terminou.
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Vamos nos concentrar em assuntos educacionais?
A
entrada de Hilário interrompe a conversa. Auxiliar da coordenação de ensino há
mais de uma década, é um dos poucos civis que trabalham na Escola e exerce a
função como um diligente e empertigado mordomo.
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Senhores doutores, posso tocar o sinal?
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Sim, responde Aurélio, dobrando o jornal e com o pensamento nos arroubos
políticos de Agostinho, que considera a perspectiva de continuar depois a
conversa com Herculano, que também aventa ser esse o próximo passo do major.
Copyright © 2013
by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by
Maria Tereza O. S. Campos
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