quinta-feira, 12 de março de 2015

Capítulo Catorze

VIOLÊNCIA E BANCARROTA


Dezembro trouxe a notícia da morte de Pedro II. Herculano se abateu. Pesou-lhe a traição ao monarca e os resultados da traição. A revolução naufragara e, a cada dia, o atual governo se revelava mais tirânico. Talvez menos pela violência enrustida na natureza dúbia do novo presidente e mais pela sua condescendência com a violência praticada por auxiliares e asseclas em nome da manutenção da ordem. Chamados de Florianistas, esses civis e militares perseguiam opositores do presidente, em crimes acobertados, tolerados ou ignorados pelo governo. A delação tornou-se moeda de troca para obtenção de empregos públicos na cidade.
Preocupados com os acontecimentos, treze generais da terra e do mar dirigiram um manifesto a Floriano, pedindo o cumprimento do artigo da Carta Magna, que preconizava a realização de novas eleições, no caso de vagar a presidência antes do período de dois anos. Ponderaram que uma eleição, sem a pressão das forças armadas, restabeleceria a tranquilidade no país e o conceito internacional da República, abalado pelas perseguições políticas. Todos os treze foram exonerados. Houve reação na tribuna e na imprensa – e novas prisões.
O civil Francisco Glicério, líder do governo no Congresso e republicano histórico, rebateu a alegação de inconstitucionalidade do mandato presidencial.  Defendeu que a Constituição se referia à eleição pelo voto direto e sem disposição referente ao escrutínio anterior, que fora indireto. Parlamentares e jornalistas, que discordaram, foram presos, e a imprensa submetida à censura.
Em agosto, faleceu Deodoro e, ao revés do seu pedido de ser sepultado em trajes civis, baixou a cova em farda e com honras militares. O ano de 1892 terminou em meio à ruína dos alicerces financeiros da República. A bolsa quebrou, empresas faliram, o desemprego ampliou e o custo de vida foi às alturas.
Em fevereiro de 1893, um conflito armado estourou no Rio Grande do Sul, com a eleição direta do positivista Julio de Castilho à presidência do estado. Deposto por Floriano, em 91, o político voltou ao cargo com um golpe em 92; foi retirado com um contragolpe pouco tempo depois e, nesse momento, combatia seus adversários oriundos de antigas lideranças locais, denominados de federalistas. 
A atuação de Castilho pôs Herculano frente a frente com seus limites. Enquanto permanecia imobilizado pelos princípios da retidão, o correligionário de ideais galgara o poder e nele se mantinha com suspeitas desabonadoras aos seus métodos. Como edificar um Estado positivista a partir do adobe de tramas oportunistas que se reverterão no germe debilitador do futuro aspirado? Não podia se abater com comparações incomparáveis. Perseverar era a palavra de ordem.
O conflito no Rio Grande do Sul se espraiou para o estado do Paraná. Outra revolta eclodiu. O ex-ministro da marinha de Floriano e ex-participante do grupo que levara o presidente ao poder ocupou as águas da Guanabara e atacou a Fortaleza de Santa Cruz, empunhando a bandeira de reaver o império da constituição aviltado pelo chefe da nação. Tropas legais fizeram a defesa da Capital Federal e de Niterói, cidade do outro lado da baía. O país entrou em Estado de Sítio. O conflito recrudesceu. Os revoltosos da Capital Federal se uniram aos federalistas e invadiram o estado de Santa Catarina. O governo paulista negociou apoio militar ao chefe da nação, em troca da retirada da sua candidatura à próxima eleição presidencial. Acordo firmado, Castilho, o inimigo de ontem de Floriano, tornou-se seu aliado desses dias.

Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos



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