VIOLÊNCIA E BANCARROTA
Dezembro
trouxe a notícia da morte de Pedro II. Herculano se abateu. Pesou-lhe a traição
ao monarca e os resultados da traição. A revolução naufragara e, a cada dia, o
atual governo se revelava mais tirânico. Talvez menos pela violência enrustida
na natureza dúbia do novo presidente e mais pela sua condescendência com a
violência praticada por auxiliares e asseclas em nome da manutenção da ordem.
Chamados de Florianistas, esses civis e militares perseguiam opositores do
presidente, em crimes acobertados, tolerados ou ignorados pelo governo. A
delação tornou-se moeda de troca para obtenção de empregos públicos na cidade.
Preocupados
com os acontecimentos, treze generais da terra e do mar dirigiram um manifesto
a Floriano, pedindo o cumprimento do artigo da Carta Magna, que preconizava a
realização de novas eleições, no caso de vagar a presidência antes do período
de dois anos. Ponderaram que uma eleição, sem a pressão das forças armadas,
restabeleceria a tranquilidade no país e o conceito internacional da República,
abalado pelas perseguições políticas. Todos os treze foram exonerados. Houve
reação na tribuna e na imprensa – e novas prisões.
O
civil Francisco Glicério, líder do governo no Congresso e republicano
histórico, rebateu a alegação de inconstitucionalidade do mandato
presidencial. Defendeu que a
Constituição se referia à eleição pelo voto direto e sem disposição referente
ao escrutínio anterior, que fora indireto. Parlamentares e jornalistas, que
discordaram, foram presos, e a imprensa submetida à censura.
Em
agosto, faleceu Deodoro e, ao revés do seu pedido de ser sepultado em trajes
civis, baixou a cova em farda e com honras militares. O ano de 1892 terminou em
meio à ruína dos alicerces financeiros da República. A bolsa quebrou, empresas
faliram, o desemprego ampliou e o custo de vida foi às alturas.
Em
fevereiro de 1893, um conflito armado estourou no Rio Grande do Sul, com a
eleição direta do positivista Julio de Castilho à presidência do estado.
Deposto por Floriano, em 91, o político voltou ao cargo com um golpe em 92; foi
retirado com um contragolpe pouco tempo depois e, nesse momento, combatia seus
adversários oriundos de antigas lideranças locais, denominados de
federalistas.
A
atuação de Castilho pôs Herculano frente a frente com seus limites. Enquanto permanecia
imobilizado pelos princípios da retidão, o correligionário de ideais galgara o
poder e nele se mantinha com suspeitas desabonadoras aos seus métodos. Como edificar um Estado positivista a partir
do adobe de tramas oportunistas que se reverterão no germe debilitador do
futuro aspirado? Não podia se abater com comparações incomparáveis.
Perseverar era a palavra de ordem.
O
conflito no Rio Grande do Sul se espraiou para o estado do Paraná. Outra
revolta eclodiu. O ex-ministro da marinha de Floriano e ex-participante do
grupo que levara o presidente ao poder ocupou as águas da Guanabara e atacou a
Fortaleza de Santa Cruz, empunhando a bandeira de reaver o império da
constituição aviltado pelo chefe da nação. Tropas legais fizeram a defesa da
Capital Federal e de Niterói, cidade do outro lado da baía. O país entrou em
Estado de Sítio. O conflito recrudesceu. Os revoltosos da Capital Federal se
uniram aos federalistas e invadiram o estado de Santa Catarina. O governo
paulista negociou apoio militar ao chefe da nação, em troca da retirada da sua
candidatura à próxima eleição presidencial. Acordo firmado, Castilho, o inimigo
de ontem de Floriano, tornou-se seu aliado desses dias.
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