UM TURBULENTO OCASO
Os embates entre o Exército e o gabinete imperial
não cessaram. A pressão pela abolição continuou. Pedro II viajou para tratar da
saúde, e, em maio de 1888, Isabel, então princesa-regente, aboliu a escravidão.
No meio da multidão que aclamava a soberana, Herculano observou a emoção
cintilar nos rostos ao redor. Ante a benfazeja comoção, duvidou que estivesse
próximo o tempo em que teria de enfrentar de vez seu dilema entre a lealdade a
Pedro II e o amor à República.
Em agosto o monarca retornou da Europa debaixo de
saudações calorosas do povo. É amado,
constatou o aluno-oficial, tranquilizando-se com relação às suas apreensões.
Saudoso, afrouxou suas regras, vestiu a farda na qual reluzia o símbolo da
atrasada promoção de alferes e compareceu ao beija-mão de boas-vindas ao rei,
que lhe abriu um afável sorriso.
-- Bela insígnia, meu jovem.
-- Obrigado, majestade. Fui promovido recentemente.
-- E não sei? Mesmo de longe acompanho vosso
progresso e faço gosto de ser eu quem irá pôr a próxima divisa nessa farda.
-- Será uma honra, majestade, respondeu Herculano
com o coração apertado dessa vez, por constatar a fragilidade física de Pedro
II em olhos ainda mais azuis.
A felicidade com o ato redentor de Isabel e o
retorno do rei ainda vibrava nas ruas, quando sobrevieram os efeitos de uma
abolição sem planejamento. Milhares de ex-cativos deixaram as plantações rumo
às capitais à procura de melhores condições de vida. Não houve emprego nem
moradia para tanta gente. Viração, pobreza e mendicância cresceram; lavouras
paralisaram-se, fazendas caíram em ruínas; levas de trabalhadores imigrantes
aportaram no Brasil e faltou dinheiro para pagar salários.
Republicanos culparam o governo pelas agruras dos
libertos e da produção desorganizada. Comícios contra o trono eram
realizados com armas em punho e interrompidos com pancadaria. Os paulistas
exclamaram: -- queremos a República como a solução mais pronta à crise social.
Herculano percebeu que se tranquilizara em vão: a monarquia vivia em
turbulência o seu ocaso.
Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
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