terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Capítulo Setenta e Oito

DO INVESTIGADOR


Outra visita surpreende Catarina uma semana depois. De luto e aflitas, Eudóxia e Amelinha confirmam a participação na campanha.
-- Mas só escrevemos umas duas ou três cartas.
-- Por que não me contaram?
-- Carlota pediu segredo, para te poupar.
-- Então foram vocês que escreveram aquela carta apimentada?
-- Não, pensamos que tivesse sido você.
-- Enganaram-se. Alguém se meteu na campanha.
-- São muitas as interessadas no combate ao meretrício.
-- Melhor encerramos esse assunto de vez.
-- Não podemos.
-- A decisão já não está mais em nossas mãos.
-- Como assim?
-- Um delegado investiga o assunto.
-- A troco de quê se o suicídio foi confirmado?
-- Adalberto também disse isso.
Catarina se empalidece de vez.
-- Em que circunstâncias?
-- Tive que contar. Não podia esconder do meu marido que um delegado esteve em nossa casa para falar comigo.
-- E depois na minha. Precisei também por Onofre a par.
Desassossegada, Catarina se remexe na cadeira. Amelinha se preocupa.
-- Sente-se bem?
-- Como poderia?
-- Oh, querida, não podíamos deixar de te avisar.
-- Fizeram bem. O que mais seus maridos sabem?
-- Só da visita do delegado e do interesse dele na morte de Carlota.
-- Santo pai, o que esse homem quer?
-- Perguntou se o magistrado tinha uma amante. Não dei trela. Falei que aquilo era desonroso e corri com ele de casa.
-- Eu também.
-- Como ele reagiu?
-- Atrevidamente. Insinuou a minha participação nos Cruzados.
-- Comigo foi categórico. Disse das cartas que escrevemos na casa de Carlota.
-- Como poderia saber?
-- Alguma criada deve ter falado. Às vezes a gente bebia um pouco de Porto para ter inspiração... Podemos ter falado alto.
-- O delegado ameaçou contar para Adalberto ou para Onofre?
-- Não. Só queria mesmo saber da causa do desespero da Carlota.
-- Estamos tão aflitas! Imagina se ele der com as línguas nos dentes?
-- Se quisesse, já teria feito isso.
-- Então por que esteve conosco?
-- É o que me pergunto.
-- O que vamos fazer?  
-- Ficar quietas. Não ganhamos nada com a precipitação.
-- Pesa-nos tanto saber que demos ilusões para Carlota.
-- Deveríamos tê-la ajudado a buscar o consolo divino...
-- Não lutar contra suas adversidades conjugais.
-- Precisamos ser fortes. Temos Sóror Helena do nosso lado. Pediu-me discrição e atenção. Esteve com vocês, não?
-- Sim e nos pediu silêncio completo para a alma de Carlota finalmente descansar.
-- Mas o problema somos nós. Como viver o luto em paz com essa ameaça?
-- A quietude nos protegerá.
-- Sinto como se uma adaga estivesse apontada para o meu peito.
-- E eu estremeço a cada batida no portão.
-- Nossa Senhora não nos faltará: como mulher, entende o que fizemos.
-- Talvez devêssemos nos confessar.
-- Já o fizemos. Não há penitência maior do que esta pela qual passamos.
-- É injusto ser culpada por ajudar uma amiga.
-- Vamos rezar uma salve-rainha pela paz de Carlota e de nossos corações.
Olhos se fecham, mãos se cruzam e lábios balbuciam a prece.

Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos


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