terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Capítulo Cinquenta e Oito

NO JARDIM BOTÂNICO


O feriado de Finados termina e um bilhete de Grego chega ao casarão. Após momentos de indecisão, Páscoa responde: terça-feira, 8h, Jardim Botânico. Portão principal.  Comparece ao encontro.
Quietos, o casal caminha por uma aleia de palmeiras imperiais. O ar é leve e fresco. Páscoa contempla a amplitude verde desconhecida e mira um arvoredo distante. Grego sugere que sigam para lá. Alcançam mangueiras de troncos fartos e trilham por entre outros de copas frondosas que cortinam o céu. Galhos esparramados entrelaçam-se nos vizinhos, como mãos que procuram não se separar. A luminosidade suave e o cheiro de terra confortam, acalentam os sentidos. Sentam-se num banco. Que preguiça de falar! Pelos dois, ficariam em silêncio, ouvindo o frêmito das plantas e a cantiga da água. Mas o tempo urge.
-- Preciso lhe falar e são temas desagradáveis.
-- Mas antes me escuta. Fui rude com você. Perdão.
-- É. Foi.
-- Oh, Vida!
-- Acontece.
-- Diga tudo, sem receios.
-- Tenho adiado meu pedido de separação. Esperado o melhor momento para falar com o meu marido, mas vejo que essa ocasião nunca chega e não posso mais adiar o que precisa ser feito. Quero que se proteja. Seria bom se pudesse viajar.
As palavras são como um soco no estômago de Grego. É vergonhoso se imaginar em carreira enquanto ela fica entregue à própria sorte. Deve pegar o timão dos acontecimentos e defender essa criatura que tanto prazer lhe deu.
-- Pode esperar um pouco mais?
-- Por quê?
-- Preciso de tempo para organizar a partida. Pegamos Sofia e sumimos daqui.
Páscoa o contempla com dúvidas no olhar.
-- Para onde iremos?
-- Atenas. Lá poderei cuidar melhor de vocês.
A mulher ainda imagina o mar, o navio, os três a caminho de outro destino... Mas o coração aperta. Não é assim que quer essa possibilidade para si.
-- Como acha que a sua família irá receber uma fugitiva com a filha?
-- Não precisamos dar detalhes.
-- A informação não atravessa o mar?
-- Até lá vocês já farão parte da família.
-- Crê que será feliz?
-- É o que precisa ser feito.
-- Será o melhor caminho?
O outro é cada um seguir sozinho. Como dizer isso? -- Não vejo outra saída.
-- Eu sim. Preciso enfrentar meu marido e sair do outro lado do que possa vir a me acontecer. Quero a minha liberdade, ao preço que for.
A resposta causa preocupação.
-- Não terá a separação.
-- Tenho que tentar. Não quero ser uma fugitiva.
-- Pense que viverá uma vida nova.
-- Mas sem poder retornar para cá nem desfrutar do que é meu por direito.
Grego só apreende o sentido que pretere a sua ajuda, não o da liberdade ansiada.
-- Falando assim não me dá outra saída senão cruzar os braços.
-- Sinto por esse transtorno.
-- Por favor, Páscoa, não sou eu que mereço preocupação.
-- Espero que me entenda, mas não poderemos nos ver até tudo se resolver.
-- O que Maria Luísa acha?
-- Irá me ajudar e prometeu que o irmão também.
-- Se seu marido a ameaçar, fuja para a casa da Glória e deixe seus amigos resolverem a questão. Hoje mesmo me mudo para lá.
Apreensões geram o silêncio e Grego rompe a sua imobilidade. Puxa Páscoa pela mão e a abraça atrás de uma árvore. Beijos sôfregos se sucedem.

Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos


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