terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Capítulo Quatorze

O PASSEIO TERAPÊUTICO


Quão longa é a curta espera! Compenetradas, Páscoa e Sofia estão sentadas no sofá da sala, com as mãos enluvadas sobrepostas no cabo de suas sombrinhas, mantidas de pé sobre o chão. Aguardam o horário do passeio terapêutico. Os olhos... Ah, os olhos! Esses não param. Minuto a minuto conferem o avançar dos ponteiros do relógio. Só falta um pouco mais... Um pouquinho só... Agora... E a aguardada badalada da quinta-hora da manhã soa definitivamente. A excitação impulsiona os corpos, que se levantam. Quitéria entra apressada. Herculano desce as escadas e une-se a elas.
-- Vamos! 
O marido abre a porta. A esposa sai e se embebeda da massa prateada e flutuante à sua frente. O céu ainda está acinzentado sobre os limites do arraial à direita, mas, na direção oposta, para além das pedras negras, o vermelho e o amarelo já o tingem. Os sentidos da mulher afloram. O coração palpita fortemente e Páscoa atravessa o portão, aberto por Tião, com Herculano ao seu lado e a filha e a ama atrás.
     A família se locomove pela rua-praia rumo ao nascente. Cheios de compostura, andam, andam, e pensam de muitos modos. Há os que não sabem qual a precisão de estar ali; há os que preferiam não estar; há os que gostariam de estar, mas de outro modo, e há os que apreciam estar até desse jeito mesmo. As pedras negras são alcançadas – Quitéria se benze, tem cismas com o costão – e, sem um minuto sequer de descanso, o grupo volta, com a compostura em pingos e os ombros tombados mais em uns do que em outros. Ninguém fala. No entanto, quanta eloquência com eles próprios! Quitéria está certa de que esse estirão não é para ela. Tanta coisa por fazer! Mas deixa o Capitão ir embora... Exatamente o que Herculano planeja: partir. O banhista não se atreverá a pôr os pés aqui; não posso perder tempo com esse ir-e-vir. Esbaforida de calor, Sofia também se ressente do passeio. Papai não deixa nem pegar conchinhas... Já nos pensamentos de Páscoa vagueiam lembranças que deslizam para sua nascente, para o mar. Por onde andará o banhista?


Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos

Nenhum comentário:

Postar um comentário