domingo, 25 de janeiro de 2015

Capítulo Quarenta e Sete

DA REAÇÃO INESPERADA


 Theodoro é recebido na fazenda de Divisa. Observa o sorriso amoroso de Catarina em semblante esmaecido, mas não externa preocupação. Logo depois, na privacidade do quarto, pergunta a razão do seu abatimento.
-- Não se sente bem?
-- É apenas o doce suplício do nosso amor realizado.
-- O que quer dizer?
-- Aconteceu. Seremos pais.
Theodoro esperava esse momento, imaginara como reagiria ao ouvir essa notícia. Porém, em vez de se exaltar com o desejo realizado, de se orgulhar com o atestado de virilidade obtido, abate-lhe o peso da desconfiança, de não saber até onde o ímpeto de Catarina a levou depois do indisciplinado banho de mar. Tensiona-lhe o fato de ela não ter-lhe contado a novidade por carta. Teria tido tempo para se acertar com a diferença entre a situação imaginada e a realizada. Tomado por uma sensação opressiva, senta-se.
-- Por que não me escreveu contando?
-- Como poderia abrir mão da felicidade de ver sua alegria primeira?
O descompasso entre a alegria sugerida e a fisionomia pressentida aumenta a opressão dele. Tudo parece fugir ao seu controle. Fita-a com um olhar inquisidor.
A perscrutação sobre si e a reação atônita preocupam Catarina. Debate-se em silêncio, sem saber o que fazer. Teme que o marido desconfie da sua entrega a Valentin e, pior do que desconfiar de sua lealdade, é confirmar a própria esterilidade. Prefere que ele jamais conheça essa dor.
A percepção de Theodoro acerca da estupidez de se voltar contra a sua aliada de todas as horas, por causa de um ciúme ridículo, ajuda-o a soerguer-se dos sentimentos conflitantes. Expressa a verdade inacessível a qualquer reação primária.
-- Sua gravidez é o maior presente que pode me dar.
-- Seremos uma família de fato.
É isso o que importa, pensa Theodoro. Porém, quer ficar um tempo sozinho. Levanta-se e caminha. A mulher o indaga.
-- Aonde vai?
-- Andar um pouco.
-- Irei com você.
-- Melhor se poupar.
-- Sinto-me bem.
-- Ainda assim, fique.
-- Mas quero tanto...
-- Fique, é uma ordem.
-- Estarei com você em pensamentos.
Theodoro sai. O olhar assustado de Catarina mira o nada como a um espelho no qual vê refletidos seus medos. Acaricia o berloque e cogita que o marido esteja tomado pelo medo dos riscos da gravidez. Pede a sua estrela-guia força para vencer esse decepcionante momento e proteção para viver a sua gravidez como sonhou.
O clima entre o casal melhora na manhã seguinte, quando Theodoro participa ao sogro a notícia do rebento a caminho. Feliciano já suspeitava da concepção e comentado com a esposa, que lhe disse apenas: -- também acho, mas vamos aguardar para ter certeza. Aguardou e, neste momento, abre um sorriso emocionado com a notícia. Crê que as ervas manipuladas por ele ajudaram a natureza a cumprir a sua função. Abraça a filha e o genro. A mãe se comove e entrega seus receios nas mãos de Nossa Senhora. 
Após o festivo almoço pascal, os pais levam o casal para pegar o trem. Ao longo do trajeto, Catarina passa mal e obriga várias paradas. Finalmente chegam à estação. Theodoro e Feliciano acham melhor ela não viajar. Constança resiste; tem que lugar de mulher é do lado do esposo, em qualquer situação. A grávida hesita e o marido decide a questão: -- melhor ficar, venho te buscar quando te sentires mais forte, diz e parte.  
Os dias passam. Catarina anda chorona. Ora porque a indisposição não a abandona, ora porque teme que o seu estado debilitado faça mal ao bebê. Às vezes, também sente medo de um parto difícil. Outras vezes, se entristece ao lembrar-se da reação tensa de Theodoro ao saber da gravidez. E, ainda que sinta saudades, que concorde com a mãe de que seu lugar é ao lado do marido, a única coisa que quer é ser cuidada e acarinhada como tem sido pelos pais. Abril chega ao fim e o desconforto da gravidez diminui conforme o mês de maio avança.

Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos

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