DA REAÇÃO INESPERADA
Theodoro é recebido na
fazenda de Divisa. Observa o sorriso amoroso de Catarina em semblante
esmaecido, mas não externa preocupação. Logo depois, na privacidade do quarto,
pergunta a razão do seu abatimento.
-- Não
se sente bem?
-- É
apenas o doce suplício do nosso amor realizado.
-- O
que quer dizer?
--
Aconteceu. Seremos pais.
Theodoro
esperava esse momento, imaginara como reagiria ao ouvir essa notícia. Porém, em
vez de se exaltar com o desejo realizado, de se orgulhar com o atestado de
virilidade obtido, abate-lhe o peso da desconfiança, de não saber até onde o
ímpeto de Catarina a levou depois do indisciplinado banho de mar. Tensiona-lhe
o fato de ela não ter-lhe contado a novidade por carta. Teria tido tempo para
se acertar com a diferença entre a situação imaginada e a realizada. Tomado por
uma sensação opressiva, senta-se.
-- Por
que não me escreveu contando?
--
Como poderia abrir mão da felicidade de ver sua alegria primeira?
O
descompasso entre a alegria sugerida e a fisionomia pressentida aumenta a
opressão dele. Tudo parece fugir ao seu controle. Fita-a com um olhar
inquisidor.
A
perscrutação sobre si e a reação atônita preocupam Catarina. Debate-se em
silêncio, sem saber o que fazer. Teme que o marido desconfie da sua entrega a
Valentin e, pior do que desconfiar de sua lealdade, é confirmar a própria
esterilidade. Prefere que ele jamais conheça essa dor.
A
percepção de Theodoro acerca da estupidez de se voltar contra a sua aliada de
todas as horas, por causa de um ciúme ridículo, ajuda-o a soerguer-se dos
sentimentos conflitantes. Expressa a verdade inacessível a qualquer reação
primária.
-- Sua
gravidez é o maior presente que pode me dar.
--
Seremos uma família de fato.
É isso o que importa, pensa Theodoro. Porém,
quer ficar um tempo sozinho. Levanta-se e caminha. A mulher o indaga.
--
Aonde vai?
--
Andar um pouco.
--
Irei com você.
--
Melhor se poupar.
--
Sinto-me bem.
--
Ainda assim, fique.
-- Mas
quero tanto...
--
Fique, é uma ordem.
--
Estarei com você em pensamentos.
Theodoro
sai. O olhar assustado de Catarina mira o nada como a um espelho no qual vê
refletidos seus medos. Acaricia o berloque e cogita que o marido esteja tomado
pelo medo dos riscos da gravidez. Pede a sua estrela-guia força para vencer
esse decepcionante momento e proteção para viver a sua gravidez como sonhou.
O
clima entre o casal melhora na manhã seguinte, quando Theodoro participa ao
sogro a notícia do rebento a caminho. Feliciano já suspeitava da concepção e
comentado com a esposa, que lhe disse apenas: -- também acho, mas vamos
aguardar para ter certeza. Aguardou e, neste momento, abre um sorriso
emocionado com a notícia. Crê que as ervas manipuladas por ele ajudaram a
natureza a cumprir a sua função. Abraça a filha e o genro. A mãe se comove e
entrega seus receios nas mãos de Nossa Senhora.
Após o
festivo almoço pascal, os pais levam o casal para pegar o trem. Ao longo do
trajeto, Catarina passa mal e obriga várias paradas. Finalmente chegam à
estação. Theodoro e Feliciano acham melhor ela não viajar. Constança resiste;
tem que lugar de mulher é do lado do esposo, em qualquer situação. A grávida
hesita e o marido decide a questão: -- melhor ficar, venho te buscar quando te
sentires mais forte, diz e parte.
Os
dias passam. Catarina anda chorona. Ora porque a indisposição não a abandona,
ora porque teme que o seu estado debilitado faça mal ao bebê. Às vezes, também
sente medo de um parto difícil. Outras vezes, se entristece ao lembrar-se da
reação tensa de Theodoro ao saber da gravidez. E, ainda que sinta saudades, que
concorde com a mãe de que seu lugar é ao lado do marido, a única coisa que quer
é ser cuidada e acarinhada como tem sido pelos pais. Abril chega ao fim e o
desconforto da gravidez diminui conforme o mês de maio avança.
Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e
TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos
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