quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Capítulo Trinta e Sete

DEPOIS DA NOITE ORIENTAL


Catarina fecha a porta da casa de hóspede, com a coroa-trança desgrenhada. Os olhos a meia pálpebra avistam Vênus que parece ampliar e voltar o tamanho conforme reluz no céu pálido. Os lábios se espicham num sorriso de volúpias combalidas e o ser agradece às forças celestiais a proteção noturna. Mira o jardim e o sente comprido, uma estupidez de tão grande. Concentra-se e se lança adiante num cambaleante ziguezague. No quarto, joga-se sobre o leito e dorme de vez.
No meio da tarde, acorda. Sente-se zonza, sem forças. Deixar a cama? É um esforço enorme. Tirar a roupa e vestir o robe? Uma dificuldade maior. Da mesma forma, é um trabalho gigantesco abrir as janelas. A claridade cega. Catarina se afasta e deixa-se cair em uma poltrona.
Com grande alívio, vê entrar Josefa com a bandeja do café. Observam-se, sem se falar. Catarina toma goles e mais goles de água e come pedaços de melancias que refrescam o corpo. Arrasta-se para o banho e se deita na banheira. Que prazer molhar a cabeça. Ali, em olhos que se abrem e se fecham, destrincha a ilícita comunhão conjugal.
Inesquecível minha noite oriental. Muito além do necessário para conceber. Mas na justa medida do meu excesso de ser. Quanta delicadeza! E que ardor! Como posso amar o corpo de dois homens? Sou abençoada. Pude escolher um raro entre raros para me casar e um inconfundível para me fecundar – não me abandone, minha Estrela-guia. Deu-me tanto. Faça a obra completa. E me ajude também a afastar Valentin. Não posso me desembestar de vez num gozo vândalo, à deriva no mar do meu desejo de ser mãe. Devo voltar ao meu reino de terras plantadas e jardinadas. Amarei você para sempre, meu puro Valentin, e desejo a graça de carregar a sua semente. Theo será um excelente pai. Dará leme e arpéu ao nosso filho ou escunas belas e poderosas para nossa filha. Adeus, meu querido, pensa e submerge. Os cabelos boiam e emolduram o rosto imerso na água. 

Copyright © 2013 by Maria Tereza O. S. Campos
Copyright de adaptação para Cinema e TV © 2005 by Maria Tereza O. S. Campos

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